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França: Economia feminista, o livro que faltava no mercado

Coucou, miga leitora, intelectual e engajada no mundo. Esse post hoje é pra você que não fica longe das notícias de economia para o seu negócio. Quando a gente alia economia e feminismo, então, só pode dar coisa boa! E foi assim que surgiu Economia feminista, um livro que, definitivamente faltava no mercado, não é mesmo? O livro acabou de ser lançado em 2020 e por enquanto ainda não foi traduzido para o português, mas vai que essa correspondente que vos escreve consegue esse job, hein? Torce por mim, miga!

A Moving Girl autora

A autora é a economista e pesquisadora Hélène Périvier, diretora do laboratório Presage da Sciences Po (importante centro acadêmico da França) e acaba de publicar pela editora da Sciences Po essa obra teórica e histórica que evoca os fundamentos de um ramo da economia, num momento em que a luta pelos direitos das mulheres está de vento em popa. A ciência econômica foi concebida por homens a serviço de uma sociedade liderada por homens, e também é a ciência social menos feminina: em seu último livro, Hélène Périvier destaca o que o feminismo traz para a teoria econômica. Mas também como uma abordagem econômica pode lançar luz sobre o feminismo e suas lutas.

“Nem sempre fui feminista. Nunca estive envolvida em minha juventude com essas questões. Na minha tese, não adotei a perspectiva de gênero quando minha disciplina era adequada, pois trabalhei com incentivos ao trabalho, mínimos sociais e políticas de combate à pobreza. Mas depois do meu doutorado, ingressei no Observatório Francês de Conjuntura Econômica como parte de um projeto europeu chamado MOCHO, for Motherhood Choices. Este projeto foi liderado por Danièle Meulders, uma reconhecida economista feminista, professora da Université Libre de Bruxelles na Bélgica. Tratava-se de determinar quais países europeus tinham o ambiente institucional mais favorável para mães trabalhadoras. Foi com essa pesquisa que descobri a importância da perspectiva feminista. Esta pergunta nunca mais me deixou desde então.”

Hélène Périvier

A seguir, confira uma entrevista que traduzi dos jornais Challenges e do site Sciences Po. Além de super esclarecedoras sobre os moldes economistas, as respostas de Hélène ainda injetam uma boa dose de energia em nós, migas que acreditam no mercado feminista para o nosso negócio. Segue aí!

Entrevista sobre Economia feminista

Você diz que sempre houve mulheres economistas, mas o trabalho delas foi desqualificado. Pode nos contar sobre isso?

O que estou tentando fazer neste livro é reabilitar as mulheres por aquilo que elas trouxeram para o pensamento econômico. Por exemplo, Julie-Victoire Daubié é conhecida por ser a primeira mulher a terprestado o vestibular na França em 1862, o que é obviamente muito importante. Mas seu trabalho com as mulheres pobres também contribuiu muito para a compreensão da situação econômica e social das mulheres no século XIX: ela mostrou que as crises afetavam mais as mulheres trabalhadoras e que elas não conseguiam encontrar trabalho porque o acesso à formação profissional e à educação negou-as disso. Tudo isso nos permite compreender os mecanismos de exclusão e discriminação no trabalho em meados do século XIX. Porém, não qualificamos Julie Daub ié como economista, por quê? Ela tem contribuído tanto para a disciplina quanto seu contemporâneo Paul Leroy-Beaulieu.


Como a economia excluiu as mulheres como objeto de estudo?

Nas ciências sociais, a economia é separada: é a menos feminizada e é também aquela em que um ramo “feminista” institucionalizado se afirma. Uma das causas é que muito poucas mulheres foram associadas aos fundamentos desta disciplina. No século XIX, as ideias de essencialismo de ambos os sexos, de naturalização da mulher, eram dominantes e compartilhadas pelas ciências médicas.

O primeiro pensador feminista liberal em economia foi John Stuart Mill, influenciado pela colega economista Harriet Taylor. Ele apostava que direitos iguais e liberdades individuais (em termos de direito de voto, de ser educado e de casar ou não) levariam necessariamente à igualdade de gênero. Esclareceu que era inútil tentar impedir que as mulheres tivessem acesso às liberdades, se fossem consideradas inaptas para exercê-las, argumento que refutou, apostou que a liberdade levaria à igualdade.

À medida que o século XIX avançava, a ideia de que as mulheres são altruístas e os homens são egoístas e constituem o verdadeiro homo œconomicus cresceu. Esses economistas sabem, porém, que o trabalho da mulher no lar, criando os filhos e preparando as refeições, por exemplo, tem valor. Mas eles nunca fazem a pergunta em termos de direitos iguais. Finalmente, no início do século XX, os neoclássicos romperam com essa visão do homo œconomicus. Isso vem eliminando as desigualdades entre homens e mulheres.

Quando é o ponto de virada na economia?

As feministas marxistas da década de 1970 propunham o trabalho de reprodução das mulheres, não suficientemente levado em conta por outros economistas marxistas. Portanto, procuraram entender por que as mulheres trabalham menos do que os homens, a oferta e a demanda no mercado de trabalho, as opções de fertilidade e, portanto, a demografia.

A verdadeira virada veio na primeira metade do século XX, com o surgimento do estado social e do mecanismo de redistribuição. Trata-se, então, de abrir novos direitos, de construir políticas públicas de apoio às famílias. Esta visão de progresso incentiva ainda mais a especialização de papéis entre homens e mulheres, graças ao “subsídio único”, em particular, os direitos são obtidos no âmbito do casamento. É essa lógica de política pública que leva, na França, à criação de um quociente conjugal, o quociente familiar, posteriormente licença parental remunerada, pensões de reversões. As mulheres são então pagas como parte da família, mas não como um indivíduo … o que é uma barreira à emancipação.

economia feminista
Hélène em entrevista para o canal France Inter | Fonte: France Inter

A economia feminista está necessariamente condenada em uma economia capitalista?

Não, existem economistas feministas neoclássicas. A perspectiva feminista atravessa todas as correntes de pensamento: é uma perspectiva normativa que traz a igualdade de gênero como uma meta a ser alcançada, usando diferentes ferramentas teóricas. Existem formas altamente regulamentadas de capitalismo, leis que enquadram a economia. Não há consenso dentro do pensamento feminista e do pensamento econômico, isso faz parte das controvérsias científicas necessárias. Na economia de mercado, existe uma dimensão emancipatória. A única coisa incompatível com a economia feminista é o pensamento neoliberal, uma ideologia que faz da competição um fim em si mesma em todos os espaços sociais.

Então, o que é necessário para se anunciar como uma economista feminista?

Você tem que organizar sua pesquisa, fazer perguntas que interessem à questão feminista e mobilizar vários métodos ou referenciais teóricos para respondê-las. Mas cuidado, não devemos prejulgar o resultado, é característico de uma abordagem científica. Se colocarmos a questão do desempenho de empresas cujos conselhos incluem várias mulheres, corremos o risco de que a resposta não seja a esperada: alguns estudos dizem que tem uma influência positiva, outros que é neutra, mesmo negativa. A introdução de cotas não pode se basear neste argumento. A economia feminista trouxe muito para a economia: ela nos permitiu decifrar vieses cognitivos, vieses de valor, medir a discriminação ou mudar a forma como as perguntas de pesquisa são feitas.

Como seria uma economia política feminista no século XXI ?

A economia política feminista é baseada em uma abordagem sistêmica de nossas sociedades. Consistiria em estabelecer políticas coerentes e transformadoras. Significa abrir mão de direitos conservadores para construir direitos progressistas e iguais. É por isso que há muita resistência. Há muitas coisas que podem ser feitas além das políticas sociais e fiscais, especialmente na questão da educação. Meu trabalho enfoca uma parte muito pequena dessa economia política feminista, aquela relacionada às políticas de redistribuição fiscal e social. Mas mostra que a economia política feminista não é uma quimera teórica, mas que se trata de escolhas normativas que poderíamos fazer, se quisermos igualdade.

Pronta pra liderar o mercado?

Não sei você, miga, mas eu fico todo orgulhosa do mundo que estamos construindo quando leio notícias assim. Economia feminista, urbanismo feminista, política feminista. O mundo fica tão mais lindo assim com igualdade de gêneros, né não? Vamos juntas!

Bisous Bisous et à la prochaine!

Carioca da gema, me formei em Publicidade pela PUC-Rio em 2009 e, aos 30 anos, resolvi mudar de área e seguir minha paixão: Letras! Comecei a nova faculdade em 2016 e hoje moro na França para realizar meu mestrado na Paris Sorbonne. Amante incondicional de bichinhos, de Sol e de viagens para qualquer lugar do planeta, estou sempre em transição (inclusive a capilar! rs)

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